Alta nos custos de produção, menor exportação e queda de preço devido ao excesso de oferta no mercado interno já acarretam redução e mesmo paralisação de atividades
Legenda: Fernando Cordeiro, criador de suínos em fazenda em Anápolis: conta não fecha desde setembro, forçando a parar com atividade em curto prazo (Foto: Diomício Gomes)
Produtores independentes de suínos no Brasil acusam prejuízos, desde setembro de 2021, que se agravaram neste início de 2022 e devem levar a uma diminuição da produção e até mesmo à paralisação de atividades, com risco de afetar já em meados do ano a oferta e o preço da carne suína ao consumidor brasileiro.
Uma série de fatores é apontada como causa da baixa remuneração aos produtores: expressiva alta nos custos de produção; queda nas exportações para a China; grande oferta no mercado interno, fazendo os preços caírem; capacidade de consumo do brasileiro cada vez mais pressionada pela inflação.
Por animal vendido de 110 quilos, o prejuízo pode passar de R$ 300, informa Eugênio Arantes Pires, presidente da Associação Goiana de Suinocultura (AGS).
Os relatos de suinocultores ligados à AGS, diz Pires, são de perda de quase R$ 3 por quilo de animal vendido, já que comercializam a carne por R$ 5, com custo médio em torno de R$ 7,80. Ele observa que o aumento da oferta de animais no país, onde ficam 81% da produção, não foi acompanhado por igual crescimento da demanda, o que está gerando essa turbulência no mercado.
A situação se agrava pelos custos maiores de produção. O preço do milho, que representa 73% da composição total da ração, subiu mais de 88% em 2021, enquanto o farelo de soja, que participa com 22%, teve alta de mais de 120% no período, explica Pires.
“De janeiro a janeiro, o farelo de soja subiu 155%”, ressalta. Milho e soja são responsáveis por mais de 80% da participação do custo operacional total.
Além disso, ficaram mais caros as vitaminas e os aminoácidos usados para fazer a ração, cujos preços são em dólar. Pires cita como exemplo a lisina, cujo preço, observa ele, passou de R$ 8 para R$ 32 o quilo em apenas seis meses.
Muitos produtos importados também começaram a faltar, o que faz ainda mais pressão sobre os preços, segundo o presidente da AGS.
A conta não fecha
“A situação ficou bem complicada”, comenta o produtor Fernando Cordeiro, que cria suínos em sua fazenda em Anápolis, a 55 km de Goiânia. Depois de um período de maior investimento iniciado em 2019, quando as exportações para a China deram impulso a forte expansão dos negócios ao longo de três anos, ele avalia que em 2022 será preciso muita cautela.
“Em 2019, todo mundo aumentou a produção de alguma forma, melhorou fábrica, instalações. As exportações começaram a alavancar. Em 2020 e 2021, o mercado interno absorveu bem. Mas para 2022, a projeção é de manter o volume ou crescer só 2%, depois de um crescimento de 30% nos últimos cinco anos”, relata o produtor.
Desde setembro do ano passado, ele diz que a conta não fecha. Na granja em que só trabalha com recria e terminação, não tem matriz, Fernando conta que eram 1.200 animais, número já reduzido à metade.
O caminho agora, analisa o produtor, é buscar vender mais no mercado interno e diminuir a produção para tentar ajustes. “Com o preço como está, é prejuízo. Mas se aumentar o preço, não consegue vender.”
Nesse cenário, a perspectiva que vê é de parar com a atividade dentro dos próximos três meses.
Quebra de safra no Sul sinaliza alívio só no 2º semestre, diz consultor
O consultor de mercado da ABCS (Associação Brasileira dos Cridores de Suínos) e da AGS (Associação Goiana de Suinocultura), Iuri Pinheiro Machado, projeta um primeiro semestre desafiador. Ele menciona a quebra de safra de milho no Sul, devido a forte estiagem, o que vai se refletir nos custos de produção.
“A expectativa é pela segunda safra, que será colhida a partir de junho no Centro-Oeste e Paraná, com previsão de 86 milhões de toneladas. Mas se vier alívio, é só para o segundo semestre”, indica.
Machado também fala do excedente de mais de 20% no mercado interno, que força a queda no preço mas não impulsiona em igual medida o consumo porque a inflação em alta diminui o poder de compra do brasileiro. O excedente apontado é de quase 300 mil toneladas em 2021 em relação a 2020.
“Se essa situação se estender por muito tempo, com um preço que não remunera o produtor, vamos chegar a um déficit na oferta de carne suína.” A orientação do consultor é frear a produção para que o preço melhore, mas observa que não há como desacelerar tão rápido a produção, que manteve o ritmo de crescimento, enquanto a demanda pelo mercado externo não acompanhou.
A exportação de proteína suína teve um salto de 2019 para 2020, e continuou crescendo de 2020 para 2021. Porém, Machado explica que o crescimento da exportação no ano passado não foi suficiente para absorver o aumento de produção.
Campanhas incentivam consumo de carne de porco
Nos últimos anos, o consumo per capita de carne suína no Brasil subiu de perto 15 kg para cerca de 18 kg, com tendência a aumentar, afirma Eugênio Arantes Pires, presidente da Associação Goiana de Suinocultura (AGS), que promove campanhas para incentivar ainda mais a opção pela proteína.
Nos mercados goianos e mineiro, onde há tradição em consumir esse tipo de proteína, Pires informa que o consumo per capta chega a mais de 20 quilos, o que favorece toda a cadeia produtiva e ajuda a amenizar a crise atual do setor.
A suinocultura brasileira cresceu vertiginosamente, atingindo os patamares previstos para 2027 em 2021, “ou seja, tivemos um crescimento gigantesco”, atesta o consultor de mercado da ABCS (Associação Brasileira dos Cridores de Suínos) e da AGS, Iuri Pinheiro Machado.
Houve aumento expressivo no consumo de carne suína nos últimos dois anos, para o que contribuiu o auxílio emergencial concedido pelo governo federal.
“Quando começou a pandemia, teve incentivo do próprio governo federal para produzir carne. Já de 2019 para 2020, havia receio de que faltaria carne para o brasileiro”, lembra Pires.
Neste início de 2022, a AGS promove duas campanhas para incentivar o consumo da carne de porco: ‘Segunda com Carne Suína’ e a ‘Carne de Porco: bom de preço, bom de prato’, esta em parceria com a ABCS. Como atrativo, o preço mais acessível em relação à carne bovina. No varejo, o quilo do corte suíno caiu para até R$ 13 nas grandes redes; a costelinha, que chegou a custar R$ 26, já pode ser encontrada pelo consumidor por R$ 18. Outra aposta é na tradição em pratos da culinária goiana.
Fonte: O Popular